Quem ensina também aprende

Sobrinhos são filhos do coração, presentes de amor. As boas lembranças de convívio ativam a memória e convidam para viajar no túnel do tempo para reviver histórias e doces momentos.

Volta a recordação da primeira ida ao teatro com dos sobrinhos. Na primeira fila lado a lado assistíamos as peripécias dos três porquinhos. Os atores no palco interagiam com a plateia, incentivavam as crianças a descobrirem e informar onde se escondia o lobo mau. Distraída com o som e o movimento, de repente o vi no  palco. Os atores surpresos com a ousadia daquele menino de cinco anos o trancaram em uma das casinhas dos porquinhos. Ele abriu a janela e gritava para que impedissem as ações malévolas do lobo mau. Com seu desempenho improvisado roubou a cena e provocou gargalhadas na plateia. Envergonhada, tentei retirá-lo de lá, mas os atores impediram e o orientaram a continuar participando. Ao término do espetáculo, os atores pediram aplausos para ele, que abraçou a todos dizendo que adorou sua primeira ida ao teatro. 

Não foram poucas as vezes que incentivei esse mesmo garoto a vencer o medo. Testemunhei sua insegurança na primeira vez que entrou no mar, acompanhado de uma imensa prancha de surf, em e de inúmeros “caldos” até conseguir vencer as ondas. Acompanhei os desafios que ele enfrentou para andar de bicicleta, skate, patins, em diversas pistas improvisadas. Foram muitos tombos, ralação e choros. Sempre o estimulei a persistir para vencer os obstáculos, valorizei suas conquistas, demonstrei meu orgulho pela sua coragem.

No primeiro acampamento em que ele viajou sozinho, eu estava lá para me despedir e garantir que tudo daria certo. Os olhos dele marejaram no abraço apertado antes da partida, mas ele aguentou firme, entrou no ônibus, sem olhar para trás, acompanhado de outros garotos e recreadores desconhecidos. Dias depois, ele telefonou informando estar adorando a aventura e pedindo para adiar sua volta, ampliando o tempo de estada. Foram, também, incontáveis feriados, fins de semana e férias, em que juntos, descobrimos novos locais e brincadeiras no campo e na praia.

Quando os pais dele decidiram mudar de cidade, meu coração quase se partiu de tanta tristeza. Mas, juntos, aprendemos que o afeto é maior que a distância e sempre é possível encontrar esquemas de idas e vindas para a presença, vencer a saudade.

Afeto e limites conviveram na mesma estrada. Havia regras a cumprir no espaço de convivência, no cuidado com brinquedos e roupas. Estava presente, também, orientação para negociações nos conflitos, e atitudes gentis e respeitosas para com outras crianças e adultos. Era preciso cumprir atividades escolares, e seguir orientações para o estudo.

Partilhamos difíceis momentos de doenças, perdas de entes queridos, separação de pessoas amadas. Aprendi que a verdade e a sinceridade, por mais que doam, é o melhor caminho para fortalecer vínculos efetivos. É preciso explicitar sentimentos, ter disposição para ouvir e aceitar a posição do outro, mesmo que ela seja diferente. Nem sempre é fácil analisar o mesmo fato sob diversos pontos de vista e tolerar decisões divergentes. Respeitar as diferenças não é discurso, mas uma prática. Aceitar a escolha do outro quando não coincide com a sua é difícil, mas é na tolerância que nos tornamos pessoas melhores.

O tempo passou rápido, os meninos sobrinhos se tornaram adultos, e minha idade hoje, próxima aos 70 anos, é mais que o dobro daquele garoto que um dia acompanhei na primeira experiência de palco. O carinho e a atenção ainda permanecem nos nossos encontros. E foi assim que de repente me surpreendi com a troca de papéis.

Em um passeio com aquele adulto que esconde o garoto ousado do passado, na cidade onde vive, conheci a mais nova atração: andar de stand up no rio. Para praticar esse esporte é preciso equilibrar-se sobre uma prancha e manejando um remo, deslocar-se sobre as águas do rio. Observamos, durante um tempo, pessoas, a maioria jovens, subindo e caindo nas pranchas. Então, ele me desafiou a praticar. Explicitei o medo em cair na água e os limites da minha idade. Ele insistiu e repetiu, como eu o fizera, há tempos atrás, a necessidade de vencer o medo.

Alugou a prancha e me incentivou a entrar no rio. Insegura, mas já disposta a enfrentar o desafio, subi na prancha e, naturalmente, despenquei na água. Pude, ao me levantar, ouvir a voz dele na margem, gritando para eu não desistir. Alguns tombos depois, fui encontrando o ponto de equilíbrio do meu corpo sobre a prancha. Aos poucos consegui usar o remo, deslizar sem medo, apreciando o prazer de andar sobre a água.

Ao sair, ele estava rodeado por algumas pessoas que, supreendentemente, me aplaudiram. Ele relatou que as pessoas perguntavam quem era aquela velha senhora, de cabelos prateados, ousada, e talvez um pouco “maluca”, para enfrentar o rio com aquela idade. Orgulhoso, dizia a todos que era a tia dele e que estava praticando aquele esporte pela primeira vez.

É impossível relatar o prazer dessa experiência, não pelo equilíbrio obtido sobre a prancha, mas pela superação do medo. Ter alguém ao seu lado, que acredita no seu potencial, que substitui os limites da sua idade pela confiança na sua capacidade, faz toda a diferença.

Exemplos, mais que as palavras, nos ensinam. Distribuir para os outros o bem que recebemos faz parte da existência, multiplica bons sentimentos e fornece sentido para a vida. Relações construídas baseadas no afeto, no respeito pelo outro, no acolhimento e incentivo para superação das dificuldades, na comemoração do sucesso conquistado, contribuem para a formação de uma alma generosa. É ensinando que aprendemos uns com os outros, independente dos laços de sangue, da idade e geração.

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8 comments

  1. Adriano Palange disse:

    Boa noite.
    Estou completamente orgulhoso de estar participando dessa obra de arte, e é muito emocionante estar lendo essas lindas e emocionantes lembrança, entre tantas outras.
    Quando recebemos carinho e amor, transmitimos esses mesmos sentimentos, e agradeço a Deus por ter o privilégio de ter uma família e familiares que sempre foram unidos.
    Agora chegou o momento de retribuir tudo que fizeram por mim, e não exitarei em momento algum estar ao lado de todos que me deram amor e carinho, assim tentando retribuir um pouco do que fizeram por mim.
    Grande beijo.

    Adriano Palange

  2. Pearl Sanford disse:

    Today, I went to the beach with my kids. I found a sea shell and gave it
    to my 4 year old daughter and said “You can hear the ocean if you put this to your ear.”
    She placed the shell to her ear and screamed.

    There was a hermit crab inside and it pinched her ear.
    She never wants to go back! LoL I know this is totally off topic but I had to tell someone!

  3. Useful information thanks

  4. Rueben Kendle disse:

    Very nice write-up. I definitely love this site. Continue the good work!

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  5. Idajamp disse:

    Oi!
    Αplaudo as mulhеrеѕ ԛue têm сoragеm dе dеsfrutar dо аmor dе muіtas mulhеrеs e esсolhеr aquelа quе ѕerá suа melhоr аmіgа durаnte a vidа асіdеntаda е loucа chamada vіdа.
    Εu quеria ѕеr aquela amiga, nãо apenаѕ a dona de саѕа еѕtávеl, cоnfіávеl е chatа dе um caѕаl соmum.
    Еu ѕоu 25 аnoѕ, Ida, da Dinаmаrcа.
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